Março Amarelo. Mês Mundial da Conscientização da Endometriose
Hoje, dia 30 de março, acontecerá em todo mundo a EndoMarcha em prol da conscientização da Endometriose. E claro, que nós não poderíamos silenciar neste mês tão importante. Por isso falaremos hoje sobre essa doença que muitas vezes é incapacitante, trazendo além dos seus aspectos jurídicos, uma entrevista com o cirurgião ginecológico, Dr. Mauro Aguiar, e o relato incrível de uma ex-tentante para que você possa se inspirar e jamais desistir de seus sonhos.
A endometriose é uma doença que afeta milhares de mulheres, diagnosticada em idade reprodutiva, como é uma doença pouco conhecida em sua etiologia e etiopatogenia não existe ainda tratamentos definitivos, apesar de existir chances de cura quando diagnosticada cedo. Além das dores insuportáveis que muitas mulheres sentem como principal sintoma, a infertilidade toma conta da dor psíquica. E para muitas mulheres com endometriose, a única alternativa para alcançar o sonho da maternidade é através da RMA (reprodução medicamente assistida), e então, a partir deste momento se inicia uma verdadeira saga.
A Infertilidade é uma realidade que está presente na História da Humanidade desde sempre. Em um passado próximo os casais inférteis estavam condenados a não terem filhos geneticamente ligados um ao outro. Somente há poucas décadas atrás que a reprodução de filhos geneticamente ligados aos pais se tornou possível para estes casais.
O núcleo familiar é objeto de muita proteção no Brasil, dentre os cuidados que se deve ter com a família está o planejamento familiar, que é o controle que as pessoas devem ter sobre a sua fecundidade e saúde reprodutiva. Já o planejamento familiar é um conjunto de ações que auxiliam homens e mulheres a planejarem a chegada de um filho ou prevenir uma gravidez, todo esse planejamento é coberto pela Lei n.º 9.263/96. Assim toda mulher que, por ter endometriose é infértil, deve procurar essas técnicas para reprodução de sua prole.
É de extrema importância lembrar a todas vocês tentantes que a nossa Constituição Federal, no artigo 226 §7º, indica que a o planejamento familiar deverá basear-se na dignidade da pessoa humana e na parentalidade responsável, sendo proibido qualquer tipo de controle ou interferência no exercício desse direito, vejamos: “Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas”.
A Constituição é clara quando VEDA QUALQUER FORMA COERCITIVA DAS INSTITUIÇÕES PÚBLICAS E PRIVADAS, ou seja, do Estado e das Operadoras de Plano de Saúde, que tentam de todas as formas excluir a obrigação de custeio do tratamento. Desta forma, saibam que os exames para diagnóstico (imagem, laparoscópico, laboratorial etc.) bem como a técnica de reprodução assistida devem estar disponíveis no SUS, como também são de cobertura obrigatória pelos planos de saúde, de acordo com o artigo 35-C, III da Lei de Planos de Saúde (9.656/98).
A saga da mulher tentante inicia desde os primeiros sintomas, percorrendo o diagnóstico, tratamento, vencendo a infertilidade até a menopausa. Por isso entrevistamos Dr. Mauro Aguiar, cirurgião ginecológico especialista em endometriose, para esclarecer as principais dúvidas sobre sintomas e tratamentos.
- O que é a endometriose e como ela afeta as mulheres? Qual a idade que a endometriose costuma surgir?
A endometriose é uma doença benigna que se caracteriza pela presença de implantes de endométrio fora da cavidade uterina. Essa condição leva as mulheres a enfrentarem sintomas de dor no período menstrual e associa-se a infertilidade feminina. A idade de acometimento é durante o período fértil da mulher, chamado menacme (entre a primeira menstruação e a menopausa). É difícil definir o momento em que a endometriose surgiu, pois o diagnóstico usualmente ocorre alguns anos após o surgimento dos primeiros sintomas.
- Quais os seus principais sintomas e quais destes costumam passar “despercebidos” pelas mulheres?
Os principais sintomas são a dor no período menstrual, dificuldade para engravidar, dor na relação sexual e outros sintomas associados a localização das lesões de endometriose (sintomas intestinais, urinários, etc no período menstrual). O problema é que culturalmente a cólica menstrual é considerada um sintoma normal e geralmente não é valorizado pela paciente e seus familiares até que torne-se muito intensa. Desta forma, a paciente pode já ter os sintomas há vários anos mas nunca procurou assistência médica para investigar suas causas…
- Eles podem ser considerados incapacitantes?
Em alguns casos a endometriose pode levar a quadros dramáticos de dor intensa que pode tornar-se crônica e independente do ciclo menstrual levando a situações incapacitantes e desesperadoras.
- O diagnóstico tardio pode agravar a doença? De que forma?
O atraso no diagnóstico faz com que a paciente não seja tratada em quadros iniciais, onde as lesões são mais leves e que poderiam ser controladas com medicação ou com cirurgias menos radicais.
- Quais os principais exames que podem confirmar o diagnóstico?
Os principais exames de imagem são a ultrassonografia transvaginal com preparo intestinal para pesquisa de endometriose (esse exame deve ser feito por profissional experiente em endometriose) e a ressonância nuclear magnética da pelve. Mas reforço a importância de se valorizar a consulta ginecológica bem feita em que se busque sinais e sintomas que direcionem o diagnóstico.
- A infertilidade decorrente da endometriose pode ser reversível? Como?
Sim. Existem diversas formas de tratamento para a infertilidade do casal com diagnóstico de endometriose, desde tratamentos clínicos, videocirurgia e técnicas de reprodução assistida (como fertilização in vitro por exemplo). Cada caso deve ser individualizado para o casal que busca engravidar e o ideal é ser conduzido por um especialista em reprodução humana.
- Após a cirurgia para retirada dos focos de endometriose é possível uma gestação natural?
A cirurgia para tratamento da endometriose aumenta as taxas de gravidez espontânea.
- E quando é possível determinar que a gestação só será possível através de técnicas de reprodução assistida em pacientes com endometriose ?
É muito difícil determinar que a gravidez só será possível com determinada técnica, na verdade a gravidade da doença e a presença de outros fatores associados a infertilidade (como problemas ovulatórios, idade da paciente, fator masculino, etc) podem direcionar a técnicas de reprodução mais complexas que elevam a chance de sucesso no tratamento da infertilidade. Por isso a importância da avaliação de um especialista em reprodução humana.
- Podemos afirmar que a endometriose não tem cura?
Sim. O tratamento da doença visa controle e aumento de qualidade de vida… Até o momento, não há como curar a endometriose.
- A gestação pode reduzir os focos de endometriose?
A gestação pode melhorar sintomas e estabilizar lesões durante o período gestacional. Mas o ideal é prosseguir com tratamento após a gestação, pois a doença pode voltar a progredir quando a paciente voltar a ter ciclos menstruais.
- O DIU de Mirena pode controlar os focos da doença?
O DIU medicado pode ser utilizado no tratamento da endometriose, com boa resposta em alguns casos.
- A alimentação ajuda no controle da doença?
A alimentação saudável e que melhore a constipação tem um papel na melhora da qualidade de vida independente da doença e deve ser implementada. Porém, até o momento não existem evidências seguras de que qualquer tipo ou suplementação alimentar interfira na progressão das lesões de endometriose.
- Qual a orientação que o Dr. pode dar para as mulheres que sofrem com a endometriose neste março amarelo?
A principal função de campanhas como o março amarelo é de divulgar a doença, então a orientação é buscar conhecer mais sobre a endometriose, compreender suas características e suas modalidades de tratamento. Por fim, buscar atendimento de seu ginecologista para enfrentar o problema e alcançar uma vida normal.
Hoje trazemos também o caso da ex-tentante, Paula Aureliano que, junto com seu esposo Diogo Veríssimo, venceram todos esses desafios, confira:
“Nossa história com a endometriose começou em 2015, período em que finalmente descobri ser portadora da doença. Até chegar ao diagnóstico, foram longos 4 anos tentando engravidar, longos dias e noites sem explicações dos motivos que me impediam de engravidar mesmo em meio aos tratamentos de estimulação ovariana com uma bomba de hormônios via oral e venosa.
Nesse período, passei por 4 médicos ginecologistas, sendo 3 desses especialistas renomados em fertilidade. Além da infertilidade, todos os meus ciclos menstruais eram de muito sofrimento. Sofria de constipação antes do ciclo e durante sofria com diarreia, gases, ciclos menstruais irregulares e muita cólica abdominal que só cessavam com o uso de fortes anti-inflamatórios , sem contar com uma TPM terrível. Lembro que, por orientação de uma amiga comecei a ler sobre a doença e, cheguei a questionar a esses profissionais se o meu problema não se tratava de endometriose ao que responderam não ser o meu caso, pois “os exames de ultrassonografia teriam acusado e que a recomendação para engravidar seria a via Fertilização in vitro (FIV) …”.
Meus exames, e os de meu esposo, até o momento estavam bem. Não me contentei em não ter respostas claras, sentia necessidade de ter clareza do que me impedia de engravidar. Poderia até recorrer a FIV, mas queria um diagnóstico. Era final de ano e me dei um tempo para respirar, pois como relatei, foram longos anos de sofrimento físico e psíquico, muitas consultas médicas, muitos exames, muitos remédios e hormônios e meu mundo paralelo não parava: rotina de trabalho puxada, cursando MBA, casa para administrar… enfim, o mundo não para enquanto você tenta engravidar.
Em 2015 tivemos a graça de buscar suporte com Dra. Altina Castelo Branco, que nos acolheu com todo seu carinho e competência e ao ouvir o relato de meus sintomas somados a infertilidade, logo suspeitou de que eu tinha endometriose e me encaminhou para avaliação com um cirurgião. Passei por mais e mais exames e comecei a me preparar para a vídeo laparoscopia, a fim de diminuir os focos da endometriose, quando num determinado momento o médico sugeriu que eu fizesse uma reserva ovariana, antes de me submeter a cirurgia, pois meus exames pré-operatórios acusavam uma endometriose gravíssima.
Nos exames pré-operatórios o cirurgião solicitou que eu fizesse uma ultrassonografia com uma médica de sua confiança, foi uma ultrassom endovaginal, mas com preparo intestinal específico. Durante a realização do exame eu não acreditava quando escutava a médica ditar para sua auxiliar: “Endometriose profunda comprometendo útero, ovários (com presença de endometrioma), trompas e intestino”. – Dra., por que as ultras que fiz anteriormente não acusaram isso? Perguntei perplexa, pois no ano anterior tinha realizado 09 ultrassonografias somente no segundo semestre, ao que ela respondeu: – “Desculpe a franqueza, mas suas ultras anteriores foram superficiais e só avaliavam os folículos”.
Apesar de estar em busca de um diagnóstico, meu chão pareceu desabar, sentia que tinha sido em vão todo o investimento de tempo e dinheiro, sem contar com o desgaste emocional de inúmeras consultas, exames, medicamentos até então realizados. Não cansava de me questionar: Como não viram isso antes??? Foi mais de um médico, foram 4 anos… foi uma adolescência e juventude toda sofrendo e não cuidando de uma doença que só se agravou ainda mais com o tempo , me causando no final de tudo a infertilidade.
Infelizmente ainda se conhece muito pouco sobre endometriose e se divulga menos ainda, seja do conhecimento popular aos cuidados médicos, ainda existe muito descaso e desatenção com uma doença tão significativa para a mulher. Além do tabu e do preconceito gigante que se tem com a mulher que tem cólicas e TPM. Era comum escutar até mesmo de meus familiares na adolescência: “quando casar passa (a cólica)”, “TPM é frescura”.
Após a recomendação do cirurgião, optamos (eu e meu marido) por realizar a FIV. Já tinha o diagnóstico que estava buscando e neste caso nossa prioridade era engravidar de nosso primeiro filho. Feito isso, com muito profissionalismo de Dra. Altina e equipe e sob muita benção de Deus e de Nossa Senhora, em abril de 2015 estávamos grávidos de nosso Miguel, nosso milagre, nosso filho tão esperado venceu conosco a endometriose e estava em nossos braços em 23.12.2015. Lembro que assim que Miguel nasceu, nossa obstetra relatava que eu tinha muitas aderências causadas pela endometriose. Passei cerca de 2 horas na sala de parto para que ela conseguisse suturar meu corte da cesárea. Dali em diante tudo que falávamos sobre endometriose era que a gravidez e amamentação são os melhores tratamentos para a doença, pois os ciclos menstruais estariam suspensos de forma natural. Mesmo assim, pós-parto, precisei fazer uso de hormônios para evitar correr o risco de menstruar.
Tempos depois decidimos empreitar nossa segunda gestação e para minha triste surpresa, a endometriose não havia regredido, nem sequer “estacionado”, como previam os médicos. Os órgãos estavam ainda mais comprometidos e as trompas impermeáveis, inutilizadas com acúmulo de líquidos causado pela endometriose. Desta vez precisei me submeter a cirurgia, não para diminuir os focos da endometriose, mas sim para a retirada bilateral das trompas (salpingectomia). Um baque, uma mutilação…
Me reergui e seguimos em busca do sonho e da esperança de ter mais filhos, dar irmãos a Miguel que já nos pedia um irmãozinho… Após a recuperação da cirurgia já iniciamos novas avaliações para a segunda FIV e mais uma vez fomos muito agraciados pelo Deus misericordioso que nos permitiu engravidar de novo, superando e contrariando as estatística médicas, estamos agora na segunda gestação, grávidos de duas meninas, à doce espera por Alice e Júlia, que também vencerão conosco a endometriose e a vida!”
Gostaria de agradecer à Paula e sua família pela disponibilidade de compartilhar sua história de superação e fé em nosso blog! E que sua determinação, garra e coragem sirva de inspiração para todas as mulheres que sofrem com a endometriose.
E você que sofre com cólicas intensas no período menstrual, dores fortes na relação ou inchaços, busquem um médico especialista em endometriose, é fundamental o diagnóstico no início da doença para que seja possível o tratamento eficaz e retorno na qualidade de vida.